sábado, 14 de outubro de 2017

Ars per ars

Aprendemos nas aulas de ciências do curso primário que existem três estados da matéria: sólido, líquido e gasoso, assim considerados porque nos transmitem sensações ao toque, ao contato ou ao cheiro. Há, porém, algo que nos transmite sensações e mesmo emoções sem estar contido nos três estados ditos, o quarto estado: o estado da arte.
De fato, no estrito sentido de transmissões sensoriais, o estado da arte é tão poderoso quanto qualquer outro estado da matéria. E, como arte, pode ser entendida qualquer manifestação que nos faça sentir emoções, ficarmos felizes ou indignados. A manifestação artística dos peladões ajoelhados em roda enfiando seus dedos nas pubendas dos que estão às suas frentes; ou o peladão que se deixa tocar pelos infantes, é arte pura, no estrito sentido que nos tiram do sério, nos deixam indignados, furibundos, inflamados e prontos para aplicar uns bons cascudos nessa gente que pratica arte rasteira, baixa e imunda. Ainda assim, no sentido teórico continua sendo arte eis que o objetivo de transmitir emoções foi alcançado. Lembremo-nos que um número qualquer tem duas raízes, uma positiva e outra negativa, esta última, igualmente importante. Afinal, a impedância, nossa velha conhecida, leva em conta os valores das raízes negativas no seu cálculo ao contrário da resistência que só leva em conta os números do campo real.
Na Grécia antiga a arte era levada a sério no seu ultésimo grau, o pessoal se reunia nos anfiteatros para ouvir versos, ouvir música ou assistir a peças teatrais. A poesia não era como esta de hoje em dia cujo único objetivo é engrandecer o traseiro feminino. Os gregos batiam os pés alternadamente, uma batida curta e outra longa, eram os chamados pés-de-verso ou iambos em grego. Sim, o precursor dos manipuladores iâmbicos. Cada linha do verso tinha que, além de fazer a rima, obedecer a uma rigorosa métrica; por exemplo: um verso sáfico deveria ter 10 sílabas em cada linha e, além disso, ter sílabas tônicas nas quartas, oitavas e décimas posições, tudo acompanhado das batidas dos pés dos espectadores. Não bastasse isso, o verso tinha que contar alguma proeza ou uma cantada nalguma grega bonita. Os gregos ainda eram bons em escultura, arquitetura e diversas outras manifestações artísticas. Decididamente eles eram o estado da arte.
As manifestações artísticas podem ainda aparecer em qualquer atividade humana, basta que a façamos bem feito, bem feito a ponto de que seu resultado nos desperte emoções. Experimente fazer arte com o CW. Sim, ao tempo que comecei no rádio, os telegrafistas tinham sua própria letra, sua própria maneira de transmitir e eram conhecidos ou reconhecidos nas bandas apenas pelas suas peculiaridades de manipulação, quem já transmitiu com um daqueles batedores sabe do que estou falando. Essa arte continua viva durante o Straight Key Night quando todo mundo sai de batedor, nada de eletrônicos ou computadores para transmitir. É a arte pela arte, ars per ars. Nesta linha, até mesmo a participação em pile-up nos permite dizer que pode haver arte no seu mais estrito senso. Quando participamos do pile-up corretamente podemos atingir o ponto mais alto das emoções auditivas: o eargasm. Este acontece quando ouvimos o nosso indicativo seguido de 599 TU. Creio que todos nós já alcançamos esse clímax mais de uma vez.
Na contramão disso tudo existem aqueles que por incúria, incompetência ou mera imbecilidade, conseguem por meios escusos e trapaceiros terem seus indicativos nos logs. Por serem incapazes de atingir emoções por meios próprios, imploram a amigos que trabalhem os DX para eles, criando sua própria arte, a arte que lhes trazem como emoções os mais baixos sentimentos contidos nos porões da alma: inveja, rancor, ira, ódio e frustração. Comportam-se como o peladão que não conseguindo ser eros tornou-se tânatos.
73 DX de PY2YP - Cesar